sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

As aventuras de Lady Alice.


00h00min, a janela está fechada. Thauany tem mania de fechá-la para que eu não saia (e também acredita que algum ser sobrenatural vá entrar por ela), mas esquece sempre da janela do quarto de costura da sua mãe ou da lavanderia. Verifico se ela está dormindo, e fujo por uma fresta da janela de metal do outro quarto até o telhado. Encontro Nino, o siamês das filhas do Valdemar, o vizinho. Ele sempre costuma passear esse horário. Nino já foi apaixonado por mim, mas deixei bem claro que não sou tipo de gata que se apaixona por qualquer um. Aliás, fui ainda mais clara; não me apaixono por ninguém. Mas confesso que seus olhos azuis me atraem.
- Oi, Nino. Observando a lua?
- Alice! Que bom que apareceu.
- O que houve?
- Estou me sentindo sozinho...
- Não seja patético, Nino. Tem de ser mais viril, assim como os cães.
- Sabe como é... As noites são perigosas...
- Gatos de raça são mesmo uns medrosos!
Ouvia-se um miado doloroso nas ruas de baixo. Era típico algum gato em apuros nessas redondezas onde tinham tantos cachorros de ruas ou gatos malandros que adoravam botar medo nos que tinham um dono.
- Ei, Nino. Ouviu isso? Vamos lá ver!
- Perdeu o juízo?!
- Deixa de ser medroso!
Descemos até o escadão. Nino tinha os pêlos da calda eriçados de tanto medo. Segui em frente, para protegê-lo. Passamos pela ruazinha escura até a outra rua. Estava deserta, afinal, já era de madrugada e a rua tinha pouca iluminação. Na verdade tinha apenas um poste de luz ligado. Aquela luz laranja e ofuscada iluminava a entrada de um beco. Fora de lá que veio o barulho – é de lá que vem todos os barulhos. Fomos até lá (com muita relutância de Nino). Logo no início tinha um gato cinza, magricela, os olhos verdes – um deles tinha uma cicatriz.
Cheguei logo peitando, comigo não há rodeios. Aquele gato tinha cara de relaxado, e devia agüentar nem mesmo uma briga com um sabiá.
- Que ta pegando, chefia?
Usei meu vocabulário de “maloqueiro”. Aprendi em uma das conversas da Thauany. Ela disse que os malandros da rua falam assim, e que tinham de usar essa linguagem para se comunicar com eles, caso contrario não compreendiam.
Aquele gato metido me estudou por uns longos dez segundos. Pra ser sincera eu senti uma ponta de arrependimento pela malandreza súbita da minha parte.
- E quem vocês pensam que são?
- Olha, somos perigosos, ta bom?
- E é? Gatos com coleira não são perigosos.
- Como se vocês manés, magricelas metidos a gângster, valessem algo!
O “cinzinha” grunhiu. Vinha em nossa direção.
- Olha o que você fez, Alice!
Sussurrou Nino. Capaz de seus pêlos estarem caindo de tanto medo.
- Ora, ora, ora... Veja se não é Lady Alice.
E surgiu do fundo do beco um gato branco, peludo, e ao contrário do resto, não era magro e raquítico. Era manco. Pimpão é seu nome.
- É um prazer vê-lo, Pimpão. – Dei as boas-vindas.
- Acalme-se, Alex.
O gato cinza recuava. Era um bobão, não agüentaria dez minutos de pancada comigo, tenho certeza.
- É, acalme-se, Alex. – Provou Nino.
- Vejo que está acompanhada...
- É, esse é o Nino, gato do vizinho.
- Prazer, Nino.
- Oi...
Nino era mesmo um babaca. Não podia demonstrar medo, mas acho que essa palavra estava tatuada na sua testa.
- Bem, o que devo a honra da sua presença por aqui, Lady?
- Sabe qual é, Pimpão? Nino e eu estávamos numa partida importante de xadrez, e um barulho muito alto nos atrapalhou, e veio daqui. Daí viemos pedir para que fizessem menos barulho.
- Perdoe-nos, Lady. Talvez exageramos na festinha.
- Festinha?! Tem ração com naguetes? – Disse Nino.
Mas era mesmo um paspalho esse gato!
- Talvez vocês queiram entrar para ver...
- É muita gentileza sua, Pimpão. Mas Nino e eu ainda temos que terminar aquela partida de xadrez, não é, Nino?
- Ora, vamos entrar um pouquinho, Alice. Estou faminto.
- Você ficou idiota?!
- Entrem, entrem. Será um prazer recebê-los...
Gato tinhoso! Vai é fazer picadinho da gente. Nino era mesmo um mané, sempre batendo bola fora. Dois gatos pretos se aproximaram. Não adiantava recuar, nos seguraram e nos arrastaram até o fim do beco. Nino como esperado gritava feito louco por socorro. Lá tinha dois gatos siameses presos contra a parede pelas patas com esqueleto de sardinhas. Clichê.
- Temos mais convidados.
- Me soltem, seus fanfarrões! Deixa só a sociedade ser adepta a escravidão a gatos pretos e vocês vão ver o que é bom pra toce!
- Cale-se, sua mimada! – Gritou Pimpão. – Já te suportamos demais. Perambula por ai, achando que é alguém, achando que tem poder. Quem manda nessas áreas somos nós!
A turma dos gatos vagabundos miaram em concordância.
- Pegamos esses siameses andando por nossas bandas. – Disse o gato cinza da entrada.
- Vocês são uns armadores. Duvido encararem a turma do Pelé no centro de Diadema. Aqueles são gatos de verdades. Não são como vocês, comedores de lixo e andarilhos prodígios. 
- Alice, você bem que poderia ficar quietinha... – Comentou Nino, tremendo as patas.
- Basta! Você fala demais, gata atrevida!
- Soltem Nino e eu se não vocês veram!
- Rapazes, arranquem-na os bigodes, para que fique quieta.
Estava na hora. Eles me subestimavam muito. Apliquei meus golpes de karate nos dois gatos pretos que seguravam a mim e Nino. Caíram em locaute.
- Peguem-na!
E saiu gato de tudo quanto é lado! Do céu, do asfalto, de trás das estrelas. Não importava, não eram páreos para mim. Bastou um golpe de “garras coletiva” e metade foi eliminado. Foi possível ver apenas rabo de nego pra lá, pata de ciclano pra cá. Meia dúzia veio em nossa direção. Invoquei meus poderes ocultos, dizendo “miau” ao contrario três vezes, um circulo de fogo se fez ao redor de mim e Nino. Foi feito churrasco de gato da forma mais literal possível. Tinha mal passado, bem passado e grelhado. Três foram atrás de Nino, que gritava feito louco.
- Aliceeeee!
- Não tenha pânico, Nino!
Foram pegos pelo rabo. Girei todos no ar, e os lancei tão alto, que é capaz terem caído na praça do Jardim Miriam.
- Ahá!
- Atrás de você, Alice! – Gritou Nino.
Era uma maçã podre. Acertou minha cabeça em cheio. Era o chefão, Pimpão. Havia me esquecido dele. Me arrastou pelas patas traseiras até o fim do beco.
- Achou que iria escapar, Alice? Vingarei-me de você.
- Me solta, perneta!
- Petulante!
Suas garras enormes se revelaram. Juro que me arrepiei até onde não se é possível arrepiar no corpo de um gato. Eram enormes! Estava acabada.
Eis que surge Nino, o gato louco!
- Yaaaaaaaaaa!
Foi preciso apenas uma chave de perna no pescoço gordo de Pimpão, e o gato branco caiu desmaiado. Tinha incorporado o Jack Chan encapetado em Nino!
- Caramba, Nino! Não conhecia esse teu lado “Ninja Assasino”.
- Me empolguei com a temática do momento.
- Ei! Ajudem-nos!
Eram os gatos presos na parede. Estavam todos muito machucados. Soltamos os dois.
- Pobres gatinhos...
- Vocês nos salvaram! Como podemos agradecer?
- Me mande um cheque por Sedex e ficamos quites.

Nino e eu voltamos até o escadão.
- Só você para nos enfiar em uma dessas, Alice.
- Relaxa, Nino. Te pago uma tigela de leite e você fica bem de novo.

De volta ao telhado, pulei até a janela do quarto. Estava fechada. Bati nela. Arranhei. Miei. No silêncio da noite, pude ouvir mesmo de fora o som da cama rangendo, o peso de um pé pisando o chão, resmungos e a janela abriu.
- Isso é hora de chegar, Alice? – Protestou Thauany. Parecia uma louca com os cabelos desgrenhados e a cara amassada. Olhei para ela como quem não sabia de nada e entrei.
- Vamos rever esses seus horários amanhã.
Miei em protesto. Ela quer que eu viva aqui nesse quarto, com essa cachorra chata e sedentária? Mas nunca!
Ela voltou para cama, e me aconcheguei ao seu lado. Foi uma noite longa e cansativa. 

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Dor e Marlboro Light.

Fumando um cigarro que não queria, Katharine caminhava na Angeles Boulevard sem determinar algum rumo. Era fim de ano. Os grandes prédios de nomes importantes competiam entre si para ver quem tinha a decoração mais apaixonante e natalina, divertindo as famílias que faziam questão de presenciar aquele show de luzes coloridas no breu da noite. Era quase onze horas e céu estava coberto de estrelas. Engraçado como as estrelas parecem ter mais brilho quando o nosso está em falta. Ouviam-se violinos. Noite amarga de sexta-feira. Acabará de assistir a peça de teatro da qual ansiará durante um mês. Talvez ela fizesse menos sentido se cada encenação não fosse tão biográfica. No final entrelaçava as pernas ao sair do auditório, embargada de magoa. Renderia ressaca no dia seguinte.
Seus olhos ainda ousaram percorrer na saída do Light Theater, tinha a suave camada de esperança adoçando seu paladar de que encontraria aquele corpo esguio, escorado de braços cruzados em frente à estação de metrô. Então ele a pediria perdão, ela talvez tentasse negar silenciosamente para somente dizer a si que tentou, mas na verdade estava cedendo mesmo antes de vê-lo. Ele a levaria para casa, e então fariam amor a noite toda, a madrugada inteira e quando acordassem, praticariam esse ato cheios de sede novamente e tomariam café juntos. Mas ele não estava lá. E acredite, o que ela viu foi uma porção de casais iluminados pelas luzes dos prédios e pareciam muito felizes, só porque ela não era.
Agora, no segundo cigarro indesejado, proporcionava a si algumas opções do que fazer aquela noite; talvez um bar, a ultima sessão de cinema ou talvez a guia de um carro fortemente contra sua cabeça. De preferência um Porsche, por mais que a desgraça seja profunda e intensa jamais desejaria que o fim de sua vida fosse com o crânio sob o pneu liso de uma Chevette.
Ameaçou entrar em três bares. Pensou sentir dois cheiros iguais ao dele. Perderá a conta de quantas vezes desejou morrer.
Katharine se deu ao luxo de encarar todos os rostos quando atravessava as cumpridas ruas da avenida, almejava encontrar aquele rosto. Chegando do outro lado, ria de si mesma, julgando completamente patético aquele ato em vão.
Mas uma coisa era certa, seu nariz estava sempre erguido, seus olhos sempre calculistas por trás daquelas lentes grossas de uma miopia precoce. De fato as lágrimas rolavam, sim, e manchavam a maquiagem feita exclusivamente para esconder qualquer traço que alegasse algo como tristeza, magoa e melancolia.
E se ela ligasse de uma cabine telefônica pedindo perdão por algo que ela não fez? “Me perdoe. Me leve com você”, talvez bastasse para que sua próxima respiração fosse menos pesada e secasse a próxima lágrima. Mas lembrou que o papel azul marcava o telefone dele estava sobre a mesa do seu quarto. Katharine sabia que não havia errado em nada. Havia depositado toda sua alma e seu ser no ser dele para que tudo fosse correto, numa interpretação diferente de coisas corretas.
Tudo bem; foda-se, a noite já estava perdida. Só queria que seus passos tivessem algum rumo. Só isso.
Uma caminhada longa até lugar nenhum. Sumiu na noite com um vácuo no peito. Dois maços de cigarros indesejados.

domingo, 28 de novembro de 2010

Cores e cheiros.

Sinto tudo com intensidade demais. Tudo me parece complexo demais. As flores para mim têm menos cor do que uma manhã cinza, e o sol é sempre bem opaco e sem luz. Ao contrario da lua, que arde meus olhos e tem uma cor tão significativa.
Uso de apenas uma e fixa filosofia: tudo se resume em cores e cheiros, pois nada faria sentido preto e branco, ou na ausencia do aroma. Tudo tem um cheiro, tudo tem uma cor. Quando não tem cor, tem cheiro, e quando não tem cheiro, terá sempre uma cor.
O vital e preciso ar sem cor, tem e traz cheiros para peitos com vácuos.
Que cor você imagina quando te digo "amor"?
O cheiro seria de ervas doces, flores frescas e folha de laranjeira.

Que cheiro tem saudade? Que cor tem Eu Te Amo?

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Medo de dizer 'eu amo'.

Nos confins de sua mente ressoava singelamente aquela frase, frase da qual tinha um vínculo perfeito com sua alma; provavelmente tomavam chá juntas e tinham conversas infinitas. Mas essas duas palavras não estavam em harmonia com sua boca; jamais foram proferidas. Ângelo possuía Alissa para si, assim como o céu possuía as estrelas. Há tantos anos... Talvez metade de uma vida. Amor iniciado na universidade, amor de mocidade tão gostoso. Conhecia o corpo da loura como a palma de sua mão. Cada curva, cada pele mais fina e cada parte mais quente, era tudo para ele como um livro que já leu várias vezes, e passou a ser seu livro predileto e o único que lia. Livro de linhas puras e perigosas, ortografia impecável e um conteúdo divino, escrito pelas delicadas mãos de Afrodite, a Deusa do amor. Então o que lhe impedia que pronunciasse tais palavras? Era tão barbara fada em sua vida. Só de imaginar, hipoteticamente, abrir os olhos e não vê-la, sufocava-lhe o desespero. Imaginá-la nos braços de outro era algo que lhe provocava vertigem e repulsa. O que lhe impedia, então, de dizer a ela tudo o que sentia? Já fazia tempo esse romance tão intenso, mas nunca uma promessa, um ‘pra sempre’ ou o tão almejado ‘eu te amo’. Tão doce mulher, amava-o tanto que nunca exigiu que o mesmo a amasse. Nunca lhe julgou por se deitar com outras mulheres, enquanto ela era só sua, inteira e para sempre sua.
Mas a vida a recolheu, achou que já era a hora de partir, ainda jovem e cheia de vida, aos quarenta e quatro anos.
Ângelo nunca soube bem o que houve, ela simplesmente não acordou mais. Majestosa, apenas adormeceu para o mundo, num sono profundo e eterno, um sorriso congelado para sempre nos lábios de carmesim. Vertera o homem inexpressivo tantas lágrimas inconsoláveis. Sua pequena Alissa foi embora.
Talvez o problema em si não tenha sido o fato de a loura ter o deixado, simplesmente não acordando mais, a sua alma largando o corpo frio sob os lençóis de Ângelo. E sim, pela covardia do homem ruivo, de nunca, nem se quer uma única e curta vez, dizer-lhe num sussurro, ou num bilhete, que a amava. Tal sentimento existia, sim, e como existia. Apenas não fora declarado. Simples? De forma alguma. Ângelo nunca se perdoará. Amaldiçoara seus lábios e coração, por nunca ter o deixado expor todo aquele sentimento bonito que sentia por Alissa, mulher que lhe confiará a virgindade e que havia insisto a lhe ceder o ventre, para que juntos, cultivassem uma pequena semente no solo do mundo chamada Maria Clara. Mas não fora possível, o empecilho rotulado como machismo e orgulho nunca o fez almejar as mesmas coisas que Alissa; não pelo menos enquanto vivia.
Agora, vendo-a no caixão, minutos antes de ser cremada, todas as coisas que lhe pareciam asneiras e loucuras proferidas pela moça que no tempo ele julgava incoerente e impreciso, lhe faziam o mais divino sentido.
Tão linda em seu vestido favorito... Aquele vestido coral que usará na noite em que completavam quinze anos de alguma coisa que eles tinham. Era seu vestido favorito. Continuava linda, mesmo morta. Os olhos fechadinhos, tão calmos, ela deveria estar se divertindo no Paraíso. Seus lábios fininhos, lábios que só foram beijados por um único homem, homem qual chorava sobre o ventre que apagará a luz da esperança de carregar uma vida ali, quando Alissa fechará os olhos para sempre.

“E-eu eu tenho tanta coisa para te falar, Alissa... Você pode me ouvir por alguns minutos?... Estou com medo. Eu não sei viver nesse mundo sem você aqui. Ele me dá medo. Está tudo tão estranho, Alissa.
Queria pedir desculpas por estar molhando seu vestido preferido com minhas lágrimas. Ele ficou sempre tão bem em você. Tudo fica lindo em teu corpo.
Eu posso ser mais direto, Alissa? Desculpe se eu for grosso.
Eu... Eu...
...
Recorda-se daquele vestido lilás que eu te dei? Aquele que você usou quando me levou para ver o pôr-do-sol naquela estrada na viagem ao Rio Grande do Sul. Você parecia uma Deusa divina nele. E quando me beijou vestindo ele, eu tremi muito. Lembrei-me do nosso primeiro beijo, naquele ano Universidade de jornalismo, quando você estava prestes a se formar, enquanto eu era um jovem ingênuo e calouro, nem mesmo conhecia o gosto de vinhos e whiskys, ou o cheiro das flores. 
Eu vou dizer agora, Alissa. Eu...
...
No aniversário de vinte anos de sua irmã, quando você passou do limite nos drinques, você chorava demais. Ficava declarando aos ventos que amava sem ser correspondida, que não agüentava mais guardar tanto amor na garganta, que ela estava inflamada, que teu peito explodia de dor por nunca saber se onde você depositava seu amor, teria alguma volta. Indagava para mim se eu a amava... Chorava em meu paletó novo... Eu nunca entendi que efeito que o álcool surdiu. Você nunca havia reclamado... Nunca me indagou nada sobre sentimentos da minha parte...
Mas, Alissa, eu sempre te...
...
Eu amava seu riso. O que mais me dá medo e não ter ele para me acalmar. Sabe, quando você ria dos quadrinhos, ou de como eu me aborrecia por ter recebido uma crítica zombeteira por uma coluna que escrevi errado... Isso me faz lembrar como era aconchegante lastimar as colunas de má crítica em seus braços. Você sempre soube me acolher direito... Encaixando-me, abordando, envolvendo de uma forma única.
Eu não estou te enrolando, Alissa. O fato é que eu...
...
 Eu adorava seus bolinhos de chocolate, por mais que eu comesse os biscoitos de aveia e sorria só para te agradar – pois eles eram péssimos -, você era uma ótima cozinheira. Não via a hora de chegar o final de semana para provar dos seus dotes culinários, e quando se mudou para meu apartamento, devo ter rezado Pai Nosso quinze vezes em agradecimento por não ter mais que comer o yakisoba horrível da senhora Yorishaya do restaurante oriental.
Certo... Finalmente vou poder te dizer que eu...
...
...E, Alissa, por mais que você achasse que não, eu notei todos os seus cortes de cabelo, todos os vestidos novos, todas as toalhas de banho que bordou, li todas as colunas feministas que você compunha... Todos os sorrisos que você formava quando me via chegar, todos os suspiros de alivio e segurança quando eu te tomava nos braços e até mesmo quando suas sobrancelhas se erguiam, apreensiva, quando você dizia algo exagerado.
Desculpa por ser tarde demais, Alissa... Por favor, eu imploro o seu perdão por ter sido covarde e tão cretino por não ter te dito nunca que eu... que eu a amo!
Eu a amo, Alissa! Eu a amo mais que a mim mesma!
Eu a amo, eu a amo, eu a amo!
Eu amo cada traço do seu rosto, cada dedos de suas mãos, cada fio de seus cabelos.
Eu amo cada suspiro que você dava, cada passo que você andava e cada erro que você cometia!
Eu amava a sua fala e seus comentários sobre seus livros favoritos!
Eu nunca amei nada mais do que amo você, mulher!
Volta, Alissa! Volta! Eu preciso te dizer isso!
Volta!!! Eu preciso dizer o quanto te amo. O quanto eu vivia só porque você acordava do meu lado todos os dias, mas não sabia disso!
Alissa, eu preciso te dizer isso. Volta. Volta, Alissa...
Volta...
Eu a amo, Alissa...
Por que não me ouve? Por que não acredita em mim?
...Você acredita, não é, Alissa? Na verdade, você sempre soube. Era esperta e calculista, você sabia de tudo.
Você via, Alissa? Dentro dos meus olhos o brilho que refletia do seu sorriso? Será que você sentia o calor do meu corpo e se questionava que era porque eu adorava quando você agarrava meu pescoço com suas mãos?
Você está me ouvindo?
Eu a amo.
Eu... Eu simplesmente te amo...
Simplesmente...”
O corpo frágil e delicado da loura queimou. As chamas a engoliram com gosto, e em poucos minutos Alissa não passava de cinzas.
O apaixonado Ângelo fragmentos suas cinzas por mares, ares, e sabe que Iemanjá, lá no mar, recolheu um pouco de sua princesa e que, Eros, no ar arrebatou metade de Alissa, guardando com esmeros.
E por anos o rapaz cheio de amor viveu apenas por viver. Com saudades eternas no peito. Arrependimentos impregnados. Chora, por assim dizer, toda noite; era a sua reza.
E assim só viveu... Esperando e esperando...
Esperando a sua vez de fechar os olhos para sempre. Poderia encontrar Alissa entre algum vínculo entre o Paraíso e o perecimento eterno do inferno, e eu curtos segundos, encontraria os olhos dela e diria que a amava.
Apenas esperava... Sentado na varanda...
Frio, arrependido, cheio de amor guardado.
Apenas esperava...

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Singelas palavras sobre uma quarta-feira de Outubro.

Hoje estou embebida de uma felicidade passageira. Aquela felicidade que estar ciente de que ela vai logo embora deixa-lhe ainda mais feliz, por saber que tem de estar feliz para aproveitar essa breve felicidade. Você o bebe, o sente, o veste e faz amor com esse sentimento. Entrei na conclusão que deve-se brindar todas as risadas, fotografar todos os sorrisos, pois cada felicidade é única. Essa jamais será gemea da que há de vir. E cada felicidade é menos intensa do que a próxima e mais intensa que a última. Por agora amarei essa, lhe darei abraços calorosos e verterei lágrimas inconsolaveis quando ela for; estou apaixonada pela minha felicidade.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Os ventos de um amor eterno.

O apanhador de espíritos marcava a entrada da aldeia. Arrebatava os mais terríveis espíritos. Já poupou da morte, cobiça e miséria adentrar aquele povo, mas não tinha proteção para o pior deles. Não é de certo um espírito, um guerreiro... Ou é absolutamente tudo. Ou apenas um sentimento.

O amor.

O amor que enlaçou Leon e Anauá, sob a margem do rio tão azul, entre uma estrela da noite e um raio da aurora. A pobre índia que, até então, nunca saberá o que é amor, logo se sentia tão diferente. Indagada a si por que o coração batia tão rápido, porque seu corpo estava tão quente, e porque tudo ao seu redor, árvores e o som da cascata de água pura da cocheira sussurrava para que ela se entregasse aos braços daquele homem branco. Era tão peculiar... Nunca verá pele tão alva, tão branca... Algo similar a nuvens, ou ao prateado pálido da Rainha Lua. Acostumada a ver peles escuras, olhos pequenos e cor de café, tudo no rosto do rapaz branco lhe atraia. Assim como os cabelos louros, ondulados, curtos na nuca, trazia o aroma da América. Mas os olhos redondos eram tão azuis quanto aquela água que os cercavam. Anauá até chegou a pensar que na verdade eram escuros, só encontravam-se azuis porque eram tão profundos, que refletiam o azul do rio. Mas não era, teve certeza quando ele se aproximou e tomou-lhe as mãos morenas. A pele da índia era tão macia, cuidada pela mais perfeita natureza. Aquele corpo que emanava pureza, como as terras virgens do Brasil. Mulata de cabelos longos, tão lisos que nem mesmo a brisa resistia, sempre os convidando para uma dança a seu gosto. Olhinhos pequeninos, expressivos e apaixonados. Boca viva, rosada, beleza natural sem pinturas, diferente de sua casa e adorada América. A índia lhe roubara o coração com apenas um olhar e um suspiro, santa libertinagem, naquele verde infinito dessas terras sem nome.
Apenas o silêncio, pois suas nacionalidades o impediam de um diálogo apaixonado. Talvez dissesse ele a índia que nunca virá tanta beleza num só corpo, ou como ela o encherá de vida apenas com o sopro de sua vida. Ela o responderia o quanto o coração dela chorava de felicidade, por ter conhecido esse sentimento gostoso e sem dor que é o rotulado amor. Ambos fariam promessas que jamais poderiam cumprir, mas que não tinha importância, o que realmente importava era aquele momento que talvez com a bondade dos deuses divinos, poderia parar e apenas existir aquele momento naquele mundo cheio de momentos, bastava apenas aquele momento, nenhum mais. De fato não era preciso palavras, a mistura dos olhos café com o azul criava uma conversa intima e celestial entre si. Houve então o primeiro beijo. As terras sob seus pés vibraram, o rio criou ondas e a brisa dava vida às árvores.
Queria ele, dizer nesse momento então, que a levaria com ele. Jamais poderia dar continuidade a sua existência caso não a levasse consigo, não a desposasse e a amasse para o resto de sua vida.
Mas uma flecha atravessou-lhe as costas, o esguio louro se curvou. Queimava tal flecha amaldiçoada pela boca do cacique, pai de Anauá, que tirara o homem branco de sua filha apaixonada e declarou: “Traiu sua tribo, sua família. Da carne desse intruso nos alimentaremos essa noite, e caso se oponha, a sua carne juntara-se ao banquete, e de seus ossos faremos armas”.
Anauá o seu corpo juntou ao de Leon, abraçando-o pela ultima vez antes de as duas cabeças serem arrancadas por lanças aguçadas. E aquela noite o banquete foi os dois, seus corações servidos por ultimo.
O rio azul do romance entre a índia e o americano foi selado com suas almas. A cascata emanava o riso da Anauá, e o vento, o suspiro forte de Leon.
Suas almas falavam a mesma língua, e por toda eternidade, poderão fazer promessas e assim, cumpri-las. Tinham todo tempo do mundo.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Lua e dor: noite de quarta-feira.

Evito olhar a lua
Pois ela faz pensar demais
Pensar em mim
Pensar em você
Pensar em nós
Mas pensar em nós dói

Pensar em você é bonito
Seu rosto entre as flores
Seu sorriso entre a brisa
Seus lábios entre os meus
Logo, penso em nós
Nenhum pensamento me vem
Houve um dia, por ventura, nós?
Sempre fora você e eu
Nunca nós
Assim, completamente heterogêneo

Sabe... Meu coração dói
Por sempre almejar você
E nunca possuir nós
Mas nós dói

E eu estou sozinha...
Eu...
Você
Nós
Nós não, por favor, porque nós dói.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

38D

Aqui, nesse banco de ônibus
Escrevo esses versos
Choro essas lágrimas
Há de alguém ter chorado aqui um dia
Nesse mesmo banco que chorei

Coração esse meu
Que dói sentido Taboão
Razões essas minhas
Tão banais perto da crise deste mundo
Contudo tão forte quanto elas
Em minha alma dói.
Já perto do Campanário
Poucas lágrimas me restam
Talvez mais algumas amarguras
E sempre vastas decepções

Talvez devesse descer no próximo ponto
Nessa rua desconhecida
Entrar naquele bar
E pedir uma dose de whisky com coragem

Aqui, neste banco de ônibus
Na longa Baependy
Sinto sua falta.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Setembro.

Espero que você me dê presentes, surpresas e flores. Que a felicidade não seja passageira, que se instale e crie raízes. Vou aconchega-la, da-la o que comer e dormir. Ser amiga e amante. E quem sabe, felicidade, eu poderia desposa-la.

Entre 7 e 5:30.

Céu liso, céu liquido
Sem nenhuma nuvem
Apenas uma estrela
Céu azul, céu profundo
Que manda a brisa fria
Que me acaricia o rosto
Que me explora a pele amostra
Impregna-se com meu cheiro
E o leva embora
Para junto do mar

Lua pálida, lua crescente de Setembro
Em forma de sorriso
Uma boca de um único lábio
Lábio prateado
Cujo beijo eu cobiço

Noite calma, noite quente de inverno
Noite azul que me acolhe
Envolvendo-me e preenchendo-me
Enche meus pulmões
Com esse ar puro das 19:30
Entorpece-me até a 00:00
Embalando-me em seu cobertor
De infinita escuridão e algumas estrelas
E arrebata-me em um sonho doce
Onde flores cantaram para mim
Pois às 5:30 tenho um encontro com o sol.

sábado, 11 de setembro de 2010

Epístola.

A carta cheirava a pólvora. Amarelada, como quem a guardava há anos. Virgem, esperou por tempos a ter seu conteúdo revelado. Cartas gostam de ver nossas reações ao ler os fatos que são confiados. Gabriela não se maquiara para lê-la, já previa as lágrimas que derramaria. Sem luxo, usava apenas brincos pretos, presente do autor da carta.

Então silêncio. Soluço. Vertigem. Amargo gosto do desespero. Estranha sensação de vazio.

Adeus e Te amo nunca foram homogêneo.

Quem ama não parte... Quem francamente ama cria raízes ao lado da cama da pessoa amada.

Lágrimas de cristal enrugavam a carta escrita há cinco anos.
Então silêncio. Soluço. Vertigem.

Dilacerando... Dissolvendo...

Silêncio.

Dor.

Sob a sombra das palmeiras.

Brisa quente que me cala
Sob a sombra das palmeiras
Deixe uma folha cair
Tocando-me na fonte
Traga-me lucidez
Dá-me amor verdadeiro

Que caia outra também em meu coração
Sondando-o, dê a ele paz
Multiplique suas forças
Francamente lhe diga que tudo está bem
Dê-lhe também asas
Para que, por cima do lago das minhas tristezas, voe
Dê-lhe amor verdadeiro

Que pouse outra em meus lábios
Beijo com gosto de solidão
Minha boca arde – solidão queima
Voe para longe, folha que me beijou
Apenas dê-me amor verdadeiro.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Sentimentos e Emoções.

De tudo se concebe a surpresa, e de chocado é conseqüência trazer tristeza, a onde nasce uma lágrima, que escorre pela face de seda e morre nos lábios que sorri que sorri por felicidade do amor correspondido, trazendo consigo a ansiedade de ter contigo os batimentos do coração que pulsa de raiva ao ser contrariado, protestando com as veias que esvaia o sangue que mancha o asfalto, despertando nos passantes susto, contido na garganta um grito, lamentando o nosso presente destruído que não causa inquietamento nos políticos, que jura nossa proteção, mas nos desperta medo e o esquecimento da esperança que desmancha o brilho dos sorrisos que almeja um abrigo nos semblantes entristecidos, do qual em conceição surge novamente a lágrima que se torna amiga do brasileiro, que se preocupo com pouco e de pouco se faz a verdade que quase não há lugar nos lábios que se curvam num falso cumprimento para os olhos da criança carente, que pouco os dentes são expostos num sorriso furtado pela infância arrebatada pela dor que veste o peito feito de curativos para esconder as cicatrizes que o tempo desferiu, quando o ponteiro errou marcando a hora errada e o dia errado em que a noiva perdeu seu relógio, e na gravata do rapaz deixou uma lágrima, dando início ao sofrimento que usa uma chave de ouro para libertar a melancolia que acerta em cheio, desfazendo os remendos, mas desperta o orgulho que avisa a alegria que já é hora de acordar e combater a constante lágrima que tudo almeja destruir, e pede também que chame a coragem para estimular os sentidos a combater os fantasmas para fazer dos dias renascimento das cinzas, pois rir e chorar é um privilégio de quem está vivo.

Diálogo Lacrado.

"Eu não posso te amar."
"Não mereço teu amor?"
"Simplesmente sou incapaz de amar outro alguém."
"A quem teu coração pertence?"
"Não vem ao caso."
"Posso amar por ambos."
"Seria injusto."
"Injusto é não deixar amá-lo. Não peço nada em troca."
"Há de exigir quando se sentir vazia."
"É amor demais para existir solidão."
"A solidão é mais infinita e densa do que o amor."
"Nada se expande mais do que o amor."
"Prometeu não me amar."
"Qual ser humano que não quebra promessas?"
"Você não se esforçou."
"Deus sabe como me esforcei!"
"Não o suficiente, tanto que está aqui, confiando-me amor."
"Quer que eu vá embora?"
"De maneira alguma!"
"Dói-me o coração."
"Por que não vai?"
"Por medo."
"De que tem medo?"
"Medo de cair no esquecimento."

Pequena Alice.


Pequena Alice mais parece gente do que irracional. Mia quando faminta e protesta sua solidão. Sai pela janela e quando volta, com os olhos esbugalhados, chega falante comunicando as novidades. Pequena Alice também é exigente; não acenda a luz e atinja-a com os raios da aurora, com os olhos preguiçosos, chama sua atenção por ter lhe arrancado do seu nobre sono. Pequena Alice também gosta de lamber; lambe cá, lambe lá, suas patas, sua barriga e suas costas. Gosta também de desferir lambidas ásperas em narizes alheios e lamber os beiços em satisfação. Mas pequena Alice não é uma criaturinha amigável; quando de mau humor mostra as unhas e lhe põe medo. Porém, pequena Alice tem seus tempos floridos; quando deita perto de sua respiração e apóia as patinhas alvas bem perto, dizendo no gesto singelo “Ei, eu estou aqui com você, viu?”. E ainda por cima, pequena Alice pensa que é Lady; mimada, acha que é da realeza, e quer tudo feito conforme seus anseios reais, e até mesmo exige uma cadeira a mesa, e contente, lambe novamente os beijos por possuir tantos subordinados. Mas pequena Alice é companheira; segue-te por todo canto, inclusive no banho, e fica de vigia em seu pedestal: a privada. Pequena Alice também caça muito bem; moscas, baratas, ratos e até mesmo sombras. Pequena Alice, ou Alicia, tem dado cor a minha vida há três anos, e vai colori-la como um livrinho infantil por muitos anos a fio, se assim permitir o papai do céu dos animais.